Festival Varadero 84

1984

Festival Varadero 84
    • Energia (Lula Queiroga) Letra

      Olha que eu conheço essa cara
      Você chegou de cima
      Vem comigo, toma a chave do meu coração
      Eu já entrei no clima

       

      Olha que eu conheço esse pique
      No seu teatro também quero ser atriz
      Deixa eu sair no seu bloco
      Me laça, me beija, me faça feliz

       

      O sol raiou
      Tomou conta da praça
      Sua energia
      O sol raiou
      Pra dizer ao país
      Que hoje é o dia D

    • Banquete de Signos (Zé Ramalho) Letra

      Discutir o cangaço com liberdade
      É saber da viola, da violência
      Descobrir nos cabelos inocência
      É saber da fatal fertilidade

       

      Descobrir a cidade na natureza
      Descobrir a beleza dessa mulher
      Descobrir o que der boniteza
      Na peleja do homem vier, quando vier

       

      Descobrir o bagaço dos engenhos
      No melaço da cana mais um beijo
      Descobrir os desejos que não tem cura
      Saracura do brejo na novena

       

      Descobrir a serena da natureza
      Descobrir a beleza dessa mulher
      Descobrir o que der boniteza
      Na peleja do homem vier, quando vier

    • Quero Ir a Cuba (Caetano Veloso) Letra

      Mamãe eu quero ir a Cuba
      Quero ver a vida lá
      La sueño una perla encendida
      Sobre la mar

       

      Mamãe eu quero amar a ilha
      De Xangô e Iemanjá
      Yorubá igual à Bahia

       

      Desde Célia Cruz
      Cuando eu era un niño de Jesus
      E a revolução
      Que também tocou meu coração

       

      “Cuba seja aqui”
      Essa ouvi dos lábios de Petit
      Desde o cha-cha-cha
      Mamãe eu quero ir a Cuba
      E quero voltar!

       

      Canto Geral
      (Pablo Neruda)

       

      Cuba, Cuba
      Flor espumosa
      Efervescente
      Escarlate

       

      Esta é a árvore dos livres
      Árvore-terra
      Árvore-nuvem
      Árvore-pão
      Árvore-flecha
      Árvore-punho
      Árvore-fogo
      Eu te amo!

       

      Pura terra
      Como tantas coisas amei contraditórias
      A rua, a flor, a abundância, o rito
      Eu te amo, pura irmã do oceano
      E amei o sistema da tua forma reta
      E a precisa extensão do teu vazio

    • Toque de Fole (Bastinho Calixto / Ana Paula) Letra

      Toque, sanfoneiro
      Um forró bem animado
      Com cadência de xaxado
      Da poeira levantar

       

      Toque, sanfoneiro
      Que as mulheres tão visando
      O fole frouxo tocando
      Castigando a nota lá

       

      Toque, sanfoneiro
      Mostre que é véio macho
      Capriche nos oito baixos
      Até o dia clarear

       

      Toque, sanfoneiro, toque
      Porque a gente quer se esbaldar
      Toque, sanfoneiro, toque
      Porque a gente quer dançar

       

      Dedo no couro é pandeirada
      Mão no zabumba é zabumbada
      E no triângulo é trianglada, oi
      Dedo no fole é forrozada

    • No Som da Sanfona (Jackson do Pandeiro / Kaká do Asfalto) Letra

      Ouvi o toque da sanfona me chamar
      Ouvi o toque da sanfona me chamar
      Ouvi o toque da sanfona me chamar
      Ouvi o toque da sanfona me chamar

       

      Um sanfoneiro bem maneiro
      Puxa o fole
      Folia a noite inteira
      Até o dia clarear
      O cabra vem se aconchegando
      Se relando
      Quando o pagode esquenta
      Ninguém quer sair de lá

       

      Êta pagode que tá bom
      Que tá danado
      Morena aqui do lado
      Faz o boneco chorar
      Chora, não chora
      Morena disse que chora
      No som de uma viola
      Faz o corpo balançar

       

      Quem é sambeiro, batuqueiro, forrozeiro
      Tem privilégio agora
      Soçaite particular
      Agora toda a classe alta quer xaxar
      Forró de brasileiro chegou em todo lugar

    • Samba Escrachado (Lenine / Zeh Rocha) Letra

      O meu samba escancarou
      No quebra-quebra
      Saiu do compasso
      E desandou

       

      Tá sem escola
      Sem passarela
      Sem diploma de embaixador

       

      É!
      É tão escrachado!
      Que vai dar uma canja
      Numa banda de jazz
      Que vai pra Montreaux

       

      É!
      É tão debochado
      Que Carmem Miranda
      No palco do céu
      Desceu para o morro e se rebolou
      Clementina foi quem vadiou
      Pixinguinha, a partir do alto, abençoou
      Pixinguinha, a partir do alto, abençoou

       

      E salve o sambista que ninguém viu
      Folia de reias
      Ginga de maracatu, bantu
      Batuque de catimbó, jongo

       

      O meu samba escancarou
      A farra de guitarra e sintetizador
      Outro pagode, outra aquarela
      No batuque de um novo tambor

       

      É!
      É tão debochado
      Que no Corcovado
      Um negro sambista se fez redentor

       

      É!
      É tão desbundado
      Que até Grande Otelo
      Na tela do mundo
      Comendo banana quase se engasgou

       

      Nem Cabral descobriu seu sabor
      Na cabeça do samba a cartola coroou
      Na cabeça do samba a cartola coroou
      Na cabeça do samba a cartola coroou...

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Ainda que não seja um LP oficial (é um bootleg), este Festival Varedero 84 entra aqui por uma curiosidade: pode ser considerado um dos itens mais raros da discografia de Elba. Foi produzido e lançado apenas em Cuba pela gravadora EGREM.

Em novembro de 1984 Elba era considerada a cantora mais popular do país e pode se dar ao luxo de interromper a temporada paulista de seu novo show, Do jeito que a gente gosta, no Palácio de Convenções do Anhembi – onde se apresentou por apenas uma semana – exclusivamente para cantar em Cuba. No retorno ao Brasil fez mais três semanas de shows em São Paulo.

Depois de passar 11 meses cantando Quero ir a Cuba, no show Coração Brasileiro, ela foi mesmo! Apresentou-se na noite de abertura do IV Festival Internacional de Música Popular, em Varadero, que ocorreu entre 21 e 25 de novembro. Ela contou: “Minha participação no festival cubano foi para mim de muita responsabilidade. Pela primeira vez o Brasil era representado por uma única artista solo. Além disso, o festival tem grande penetração na Europa e recebe a presença musical de 21 países como União Soviética, Alemanha, Austrália e Peru. Logo que cheguei, percebi a envolvência musical no dia-a-dia dos cubanos e a afinidade que têm com os brasileiros. Comentava-se muito que a representante do Brasil era uma “cantora que baila”. Enfim, a forte identidade por meio da música e dança”.

O LP foi dividido entre Elba e a tradicional orquestra Los Van Van, o mais famoso grupo cubano pós-revolução, composto por importantes músicos como o percussionista Changuito e o pianista Pupy, liderados pelo baixista Juan Formell. A parte de Elba no vinil foi composta por grandes sucessos dela no Brasil como: Banquete de signos, Toque de fole, Energia e No som da Sanfona. As outras duas músicas são pérolas até hoje inéditas em gravações oficiais em sua voz: Quero ir a Cuba, de Caetano Veloso, com direito a citação do texto Canto geral, do chileno Pablo Neruda em homenagem à Ilha – e que posteriormente seria o prefixo de No caminho de Cuba, feita por Jaime Alem a pedido da cantora; e Samba escrachado, primeira música de Lenine (com Zeh Rocha) que Elba cantou em shows – momento em que apresentava os músicos da Banda Rojão.

Elba voltou feliz ao Brasil e contou aos jornalistas: “Resumi minha apresentação em 40 minutos. Eles ficaram tão impressionados que, dois dias depois, saiu um disco com as músicas que eu havia interpretado. Uma coisa muito carinhosa: de um lado do LP, a Orquestra cubana Van Van e, do outro, “A noite brasileira” comigo, com seis músicas das 11 músicas que cantei. Pena que na gravação não tenha ficado registrada Samba do grande amor, de Chico Buarque, uma composição que ele fez dedicada aos cubanos. Aliás, a ausência de Chico foi muito sentida. Sempre me perguntavam a razão de ele não ter ido. Ele é um dos artistas brasileiros mais queridos em Cuba”.

E finalizou como a música de Caetano: “É um povo caloroso. Acharam fantástica a minha dança. Esta receptividade me levou a uma apresentação extra com os artistas espanhóis e russos. Na verdade, agora que já fui a Cuba, quero voltar”.

Tiago Silva Marques

Abril/2016

Encarte

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